quarta-feira, 5 de maio de 2010

A Oração - III. Rezar por outros


1. Dissemos que sempre rezas por ti mesmo, e isto é verdade. Então, por que deves rezar pelos outros? E, se deves fazê-lo, como deves fazê-lo? Rezar por outros, se foi entendido correctamente, converte-se num meio para eliminar a culpa que projectaste sobre o teu irmão e para que possas reconhecer que não é ele que está a ferir-te. Tens de renunciar ao pensamento venenoso de que ele é teu inimigo, o teu duplo perverso e o teu vingador antes que possas ser salvo da culpabilidade. O meio para conseguir isto é a oração com poder crescente e objectivos ascendentes até chegar ao Próprio Deus.

2. As formas que a oração adota inicialmente, nos primeiros degraus da escadaria, não estão desprovidos de inveja e de maldade. Pedem vingança, não amor. Procedem de quem não entende que são pedidos de morte, feitos com medo por aqueles que muito estimam a culpabilidade. Estas formas de oração apelam a um deus vingador, e é ele quem parece responder-lhes. Ninguém pode pedir o inferno para outro e escapar desse mesmo inferno. Só os que estão no inferno podem pedir o inferno. Aqueles que foram perdoados e aceitaram o seu próprio perdão, jamais poderão rezar desta maneira.

3. Nestes níveis, pois, o objetivo da aprendizagem não pode ser outro senão reconhecer que a resposta a qualquer oração será idêntica à forma em ela foi feita. Isto é suficiente. A partir daqui, o passo que acede aos níveis seguintes será fácil de dar. Esta ascensão começa com o seguinte:




O que pedi para o meu irmão eu não desejo para mim.
Portanto fiz dele meu inimigo.




Este passo, evidentemente não pode ser dado por quem acredita que libertar outros não tem qualquer valor nem é vantajoso para si mesmo. Portanto, pode ser adiado por muito tempo, pois pode parecer perigoso, em vez de misericordioso. Para os culpados parece ser vantajoso ter inimigos, mas este benefício fictício tem de desaparecer, se quiser libertar-se deles.



4. A culpabilidade deve ser abandonada, não ocultada. Isto não pode ser feito sem uma certa dor, e ter um vislumbre da natureza compassiva deste passo pode conduzir-nos, por algum tempo, a um medo muito profundo. Assim é porque as defesas do medo são, por si mesmas, bastantes temíveis e produzem medo quando são reconhecidas. Não obstante, para que serve ao prisioneiro a ilusão de evasão? A sua verdadeira evasão da culpa radica unicamente no reconhecimento de que a culpa desapareceu. Mas como é que ele pode reconhecer isto enquanto a ocultar em outro e não a vê como sendo sua. O medo da evasão faz com que te seja difícil dar as boas-vindas à liberdade e dá-te a impressão de que converter um inimigo em carcereiro proporciona segurança. Como é que, então, ele poderia ser libertado sem que tu experimentasses um profundo medo por aquilo que pudesse acontecer-te? Converteste-o na tua salvação e na tua evasão da culpa. O teu vínculo a esta forma de fuga é enorme, tal como é enorme é o teu medo de renunciares a ele.



5. Acalma-te, agora, por um instante e pensa no que fizeste. Não te esqueças que foste tu quem o fez e, portanto, só tu podes renunciar a isso. Estende a mão. Este inimigo veio para te abençoar. Aceita a sua bênção e sente como o coração fica aliviado e o medo desaparece. Não te agarres a este nem a ele. Ele é um Filho de Deus, como tu. Não é um carcereiro mas sim um mensageiro de Cristo. Sê isso para ele para possas vê-lo desse modo.



6. Não é fácil alguém dar-se conta de que rezar para obter coisas, posição social, amor humano ou "dádivas" externas seja de que gênero forem, é algo que se faz para instituir carcereiros e esconder-se da culpabilidade. Estas coisas convertem-se em substitutos de Deus e, portanto, distorcem o propósito da oração. O fato de desejá-las é que é a oração. Tais coisas, portanto, não têm de ser pedidas explicitamente. O objetivo de alcançar Deus é perdido de vista quando se perseguem objetivos menores, sejam eles quais forem, pelo que, assim, a oração transforma-se num pedido de inimigos. Até nisto o poder da oração pode ser reconhecido claramente. Ninguém que queira ter um inimigo deixará de encontrá-lo. Mas será inevitável perder de vista o único e verdadeiro objetivo que lhe foi dado. Pensa no custo que isto envolve e entende bem. Todos os outros objetivos são alcançados à custa de Deus.

O Canto da Oração


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